Alberto Ronald Timm
Os sinais em si não são o objeto de nossa esperança, pois somos convidados a olhar para cima e aguardar do alto a concretização da nossa redenção.
Aquela sexta-feira revestia-se de profunda tristeza para nossa família. Após quatro dias em estado de coma, minha irmã finalmente descansara. Ao chegarmos a sua casa, antes dos serviços fúnebres, encontramos Henrique, seu filhinho de três anos e meio de idade, brincando inocentemente, como se não entendesse a situação. Não muito depois, ele se aproximou de mim e perguntou: ‘Tio Ronald, sabe que a mamãe morreu?” Surpreso com a pergunta, indaguei-Lhe:
“É mesmo?... E onde a mamãe está?” — “A mamãe está lá na igreja!”, foi a resposta.
— “E o que vai acontecer agora?”, voltei a perguntar-lhe. Sua resposta foi:
“A mamãe vai ficar lá no cemitério da igreja; mas quando Jesus voltar, ela vai ressuscitar!”
Suas palavras certamente refletiam a explicação que anteriormente lhe fora dada a res peito do que estava acontecendo; mas, mesmo assim, elas eram carregadas de uma profunda esperança: ‘quando Jesus voltar!”
Em realidade, essa tem sido a esperança dos cristãos através dos séculos. Ela é um dos temas predominantes do Novo Testamento, e sua mensagem tem sido cantada pela Igreja Cristã. Muitos têm nela depositado a esperança, e têm orado fervorosamente por sua concretização. Mas qual é o verdadeiro sentido dessa esperança? Sob que aspecto deve repousar nossa ênfase ao considerarmos esse tema? O centro de nossa esperança está nos sinais que anunciam sua breve concretização, no tempo em que o evento há de ocorrer, ou nAquele que em breve há de voltar?
Sinais: Objeto de Nossa Esperança?
Ante o pedido dos discípulos (Mat. 24:3), Jesus passou a enumerar um grande número de sinais que haveriam de anteceder Sua segunda vinda. Esses sinais podem ser classificados em (1) “sinais gerais”, que são fatos que sempre ocorreram, mas que, devido a sua intensificação, se transformam em indí cios de Sua breve volta; e (2) “sinais específicos”, que ocorrem especificamente em relação com esse evento.
Se observarmos o atual contexto em que vivemos, distinguiremos um extraordinário cumprimento das palavras de Cristo. Esse fato por si só já é suficiente para fascinar qualquer estudante sincero das profecias bíblicas. Mas a pergunta que surge é: Deveremos depositar a nossa esperança nesses sinais?
É certo que os sinais da breve volta de Cristo são deveras significativos; caso contrário, o Salvador jamais os teria mencionado. Mas ao mesmo tempo em que os enumerou, Ele também advertiu: “Ora, ao começarem estas coisas a suceder, exultai e erguei as vossas cabeças; porque a vossa redenção se aproxima (Luc. 21:28).É esse “erguei as vossas cabeças” que faz a diferença entre os “homens que desmaiarão de terror” (verso 26) e os que exultarão (verso 28) em face dos últimos acontecimentos. Isso torna evidente que os sinais em si não são o objeto de nossa esperança, pois somos advertidos a olhar para cima e aguardar do alto a concretização de nossa redenção.
Como a expectativa na parábola da figueira (Mat. 24:32) não está nos ramos que se renovam, nem nas folhas que brotam, mas no verão que se aproxima, assim também a esperança do cristão não se fundamenta no cumprimento dos sinais mencionados por Cristo, mas na realidade que eles apontam: a breve volta de Cristo. Portanto, se por um lado encararmos o cumprimento dos sinais que Cristo deixou como meros acontecimentos naturais, eles deixarão de ser sinais para nós. Se, por outro lado, fixarmos neles nossa esperança, eles assumirão para nós um caráter idolátrico, em substituição a Cristo que é “a esperança da glória” (Col. 1:27).
Tempo: Objeto de Nossa Esperança?
Em diálogo com alguém que alegava ter recebido o dom profético para advertir a Igreja em nossos dias, perguntei-lhe a res peito de qual seria a necessidade de uma nova manifestação desse dom em geral para a Igreja hoje. Sua resposta foi que o mesmo Deus que chamara Ellen G. White para mencionar os eventos que haveriam de ocorrer no fim dos tempos, agora o estava incumbindo de apresentar à Igreja o tempo especifico em que os eventos irão ocorrer.
Talvez esse seja um exemplo extremo dentro de um grupo representativo que, embora não reclame para si o dom profético, julga possuir luz suficiente para advertir a Igreja da brevidade da volta de Cristo, enfatizando o tempo em que os eventos finais ocorrerão. Alguns chegam a argumentar que as palavras de Cristo em Mateus 24:36 nos impedem apenas de saber o “dia e hora”, mas que o mês ou pelo menos o ano de Sua volta é possível ser determinado. Os argumentos mais comuns baseiam-se em cálculos matemáticos elaborados sob a premissa de que em “determinado ano” terá fim o período dos “6.000 anos” e, consequentemente, nesse mesmo ano Jesus voltará.’
Em realidade, a curiosidade humana em relação com o tempo em que a volta de Cristo há de ocorrer não se limita aos nossos dias. Apesar de Cristo ter afirmado em Seu sermão profético que “a respeito daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos dos Céus, nem o Filho, senão somente o Pai” (Mat. 24:36), pouco antes de Sua ascensão os discípulos voltaram a indagar-Lhe: “Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?” (Atos 1:6).
Diante da insistência dos discípulos, Cristo claramente afirmou: “Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou para Sua exclusiva autoridade...” (Atos 1:7). Essas palavras esclarecem o fato de que quaisquer tentativas por definir um tempo específico ou época em que os eventos finais hão de ocorrer é tentar penetrar naquilo que Deus reservou para Si, e que não é de Sua vontade que conheçamos (Deut. 29:29).
Comentando a respeito desse assunto, a Sra. White declara:
“Jesus não veio assombrar os
homens com alguns grandes pronunciamentos de um tempo especial em que havia de ocorrer algum grande acontecimento, mas veio instruir e salvar os perdidos. Não veio despertar e satisfazer curiosidade; pois sabia que isto não faria senão aumentar o desejo por coisas curiosas e maravilhosas.”2 “Não devemos viver em excitação acerca de tempo. Não nos devemos absorver com especulações relativamente aos tempos e às estações que Deus não revelou. Jesus disse a Seus discípulos ‘vigiai’, mas não para um tempo definido.... Não sereis capazes de dizer que Ele virá dentro de um, dois, ou cinco anos, nem deveis retardar Sua vinda, declarando que não será por dez, ou vinte anos.”3
“Quanto mais frequentemente se marcar um tempo definido para o segundo advento, e mais amplamento for ele ensinado, tanto mais se satisfazem os propósitos de Satanás. Depois que se passa o tempo, ele provoca o ridículo e o desdém aos seus defensores, lançando assim o opróbrio sobre o grande movimento adventista... Os que persistem neste erro, fixarão finalmente uma data para a vinda de Cristo num futuro demasiado longínquo. Serão levados, assim, a descansar em falsa segurança, e muitos se desenganarão tarde demais.”4
“Tenho sido repetidamente advertida com referência a marcar tempo. Nunca mais haverá para o povo de Deus uma mensagem baseada em tempo.”5 “O tempo não tem sido um teste desde 1844, e nunca mais o será.”6 “Em vez de viver na expectativa de algum tempo especial de excitação, cumpre-nos aproveitar sabia-mente as oportunidades presentes, fazendo o que deve ser feito para que almas sejam salvas. Em lugar de exaurir as energias de nossa mente em especulações quanto aos tempos e às estações que o Senhor estabeleceu por Seu próprio poder, e reteve dos homens, devemos render-nos nós mesmos ao domínio do Espírito Santo, cumprir os deveres atuais, dar o pão da vida, não adulterado com opiniões humanas, a almas que estão perecendo pela verdade.”7
“O Senhor me tem mostrado que a mensagem do terceiro anjo deve ir, e ser proclamada aos dispersos filhos do Senhor, mas não deve estar na dependência do tempo. Vi que alguns estavam conseguindo um falso excitamento, despertado por pregarem tempo; mas a mensagem do terceiro anjo é mais forte do que o tempo possa ser. Vi que esta mensagem pode sustentar o seu próprio fundamento e não necessita de tempo para fortalecê-la; e que ela irá em grande poder e fará a sua obra, e será abreviada em justiça.”8
Cristo: O Objeto de Nossa Esperança
Ser um “adventista” não significa desconhecer o tempo e o contexto em que vivemos, para apenas acariciar sonhos e imaginações utópicas em relação com o futuro. Um genuíno adventista é alguém que aceitou a Cristo como Salvador pessoal e como Senhor de sua vida, cujo coração foi a tal ponto enternecido pelo grande amor de Cristo, que sua viva ligação com Ele aumenta cada vez mais seu anseio de vê-Lo face a face.
A gloriosa promessa de contemplar “a Sua face” (Apoc. 22: 4) não permite que centralizemos nossa esperança no tempo e nos sinais que ocorrem ao nosso redor. O tempo deixará de existir (Mat. 28:20) e a presente ordem de coisas passará (Apoc. 21:5), quando aqueles qúe depositaram sua esperança em Cristo hão de resplandecer “como as estrelas sempre e eternamente” (Dan. 12:3).
E com essa esperança em mente que o apóstolo João escreveu: “Amados, agora somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que havemos de ser. Sabemos que, quando Ele Se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque havemos de vê-Lo como Ele é ” (I João 3:2). E o resultado natural dessa ênfase em Cristo será a purificação do próprio coração (1 João 3:3) e a dedicação da vida à proclamação do Evangelho ao mundo (Mat. 24:14).
Aos primeiros discípulos Jesus desviou a atenção e a preocupação por “conhecer tempos ou épocas”, para a necessidade de receber a unção do Espírito Santo a fim de testemunharem com poder no cumprimento da missão (Atos 1:7 e 8). Por semelhante modo, o mundo será convencido, não por constatar a precisão matemática em que formulamos os cálculos em relação com os acontecimentos finais da história do mundo, mas por sentir que realmente estivemos com Jesus (Atos 4:13) e que “o amor de Cristo nos constrange” (1 Cor. 5:14).
Considerações Adicionais
Emil Brunner afirma: “O que o oxigênio é para os pulmões, a esperança é para o sentido da vida humana. Remova-se o oxigênio, e a morte há de ocorrer por asfixia; remova-se a esperança, e a humanidade será constringida por falta de fôlego. O desespero sobrevém, paralisando os poderes intelectuais e espirituais por um sentimento de uma existência destituída de sentido e propósito. Como o destino do organismo humano depende do suprimento de oxigênio, assim o destino da humanidade depende de seu suprimento de esperança.”9
A esperança dá sentido à vida humana.
O verdadeiro cristão sabe que essa esperança transcende o tempo e o espaço, e centraliza-se na segunda vinda de Cristo (1 Cor. 15:19). E Edward Gibbon identifica a fé no iminente retorno de Cristo como um dos cinco fatores mais importantes do progresso do cristianismo’0, afirmando que, enquanto essa esperança foi mantida, produziu “os mais salutares efeitos sobre a fé e a prática dos cristãos”.
Certa ocasião, ouvi o Pastor Ernest Steed, da Associação Geral, contar um episódio significativo que ele presenciou ao visitar uma das ilhas do Sul do Pacífico. Ao anoitecer, ele
acompanhou os nativos ao alojamento em que pernoitavam. Era uma construção rudimentar, na qual o primeiro andar, que ficava junto ao solo, servia de abrigo aos animais domésticos; o andar seguinte era destinado aos homens da tribo; e um terceiro andar era reservado às mulheres. De madrugada, quando ainda escuro, todos os nativos da tribo deixaram o alojamento e foram até a praia na direção em que nascia o Sol, retornando depois de algum tempo. Curioso ante o incidente, o Pastor Steed indagou-lhes a respeito do que foram fazer. Os nativos responderam que, quando o missionário adventista lhes havia pregado o Evangelho, ele afirmara que Jesus haveria de vir do Oriente (Mat. 24:27). Assim, cada manhã, eles iam até a praia para ver se Jesus já estava voltando!
Tal costume pode parecer o resultado de uma fé ingênua, aos olhos de uma mente racionalista. Mas é uma demonstração prática de fé na iminente volta de Cristo, por um grupo de nativos que aceitou o Evangelho.
Na verdade, não somos instados a estabelecer datas para a volta de Cristo, mas a crermos na iminência desse evento. Essa iminência cumprir-se-á para cada um de nós individualmente quando Jesus voltar em glória e majestade nas nuvens do céu, ou quando formos chamados ao descanso. O certo é que a cada um de nós individualmente Cristo declara: “Certamente venho sem demora.” Que nossa resposta seja como a do apóstolo João: “Amém. Vem, Senhor Jesus.” (Apoc. 22:20.)
Referências:
1. Detalhes adicionais sobre o propósito e o significado que os 6.000 anos possuem em relação com a história deste mundo nos escritos de Ellen G. White podem ser encontrados em: Warren H. Johns, Ellen G. White and Biblical Chronology’. Ministry (abril de 1984), págs. 20-23.
2. Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 187.
3. Idem, pág. 189.
4. Ellen G. White, O Grande Conflito, pag. 459.
5. __________, Mensagens Escolhidas, vol. 1 pág. 188.
6. _________ Primeiros Escritos, pág. 75.
7. ________ Mensagens Escolhidas, vol. 1, pág. 186.
8. __________. Primeiros Escritos, pág. 75.
9. Emil Brunner, Eterna) Hope (Philadelphia: The Westminster Press, s.d.l, pág. 7.
10. Edward Gibbon, The Decline and Faíl of the Ro. man Empire (New York: Modem Library, s.d.), vol1. pág. 383.
11. Ideto. vol. 1, pág. 402.
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