10 de dezembro de 2008

"Pois o Testemunho de Jesus é o Espírito de profecia" Apoc. 19:10

Ellen Gould White (Harmon, nome de solteira) nasceu em Gorham, Maine, EUA, no dia 26 de novembro de 1827. Ela faleceu no dia 16 de julho de 1915.

Uma Metodista de 17 anos de idade, foi uma força predominante na formação da Igreja Adventista do Sétimo Dia.

A mais prolífica autora americana de todos os tempos, escreveu mais de 100.000 páginas, contendo 25.000.000 de palavras escritas à mão.

A "Irmã White", como é chamada afetuosamente até hoje, é talvez mais lembrada pelos seus trabalhos no campo de nutrição e saúde ao qual alguns pesquisadores e eruditos ainda se têm revelam perplexos quanto ao seu conhecimento de saúde, muito à frente do seu tempo.

92 anos atrás os adventistas do sétimo dia foram alertados de que uma tragédia ia ocorrer na cidade de Nova York, e que envolveria os deslumbrantes e magníficos edifícios, derrubando-os e trazendo-os ao chão enquanto bombeiros com seus equipamentos não conseguiam parar a tragédia!

Realmente, a Igreja Adventista do Sétimo Dia foi alertada que a cidade de Nova York sofreria uma tragédia e muitas pessoas morreriam enquanto os bombeiros olhavam impotentes para uma tão espetacular tragédia, em que as máquinas se provavam incapazes de salvar o povo e os edifícios.

11 de Setembro de 2001 foi um evento horrível, somente uma profetisa religiosa viu e advertiu os homens de que isto ia acontecer com significativa clareza.

Ellen G. White foi uma das primeiras adventistas do sétimo dia e é reconhecida pelo mundo inteiro como uma profetisa. Ela é aceita e reconhecida na Igreja Adventista do Sétimo Dia como uma porta-voz de Deus para revelar aos homens a vontade de Deus para os últimos dias.

Ela tem-se provado certa em muitas das suas predições, mais e mais vezes. Aqui estão algumas de suas predições que chegaram realmente a se realizar tal como e verdadeiramente do modo em que havia predito.

1. Em 1869 ela disse que havia correntes elétricas no cérebro, sessenta anos antes que o Dr. Charles Mayo, da Clínica Mayo, provasse que ela estava certa.

2. Em 1854 ela alertou que fumar cigarros causaria câncer.

3. Em 1905 ela também revelou que câncer era um germe, isto também já foi provado pelo Dr. Wendell Stanley, um cientista que ganhou o maior prêmio concedido a uma pessoa.

4. Outros eventos preditos por ela aos adventistas foi que viriam mais violentas tempestades nos últimos dias da história.

5. São Francisco iria ser uma cidade reconhecida por homossexualidade igual a Sodoma e Gomorra.

6. Em 1905 ela disse que bebidas que contêm álcool destróem células nervosas do cérebro.

Em 1969, 91 anos depois dela ter dito isto, o Dr. Melvin Knisley, da Universidade da Carolina do Sul, relatou que cada vez que uma pessoa ingere uma bebida alcoólica, mesmo até uma bebida inocente como cerveja, seria afetada com dano permanente o cérebro.

O jornal The National Enquirer em 1980 publicou um artigo sobre as suas espetaculares predições (agosto, 5a. edição).

7. Ela nos advertiu que esperássemos um grande crescimento no ramo de espiritismo.
(Lembram-se de Harry Potter?)

Mas, o que é mais notável em tudo é o fato de que ela é a mensageira para os últimos dias que preenche todos os requisitos estipulados nos livros de Isaías 8:19-20.

"Quando vos disserem: consultai os necromantes e os advinhos, que chilreiam e murmuram, acaso não consultará o povo ao seu Deus? A favor dos vivos se consultarão os mortos? A lei e ao testemunho! Se eles não falarem desta maneira, a verdade não está neles." (Em outra versão diz, "jamais verão a alva".)

MAS, ELA É MUITO MAIS PRECISA NAS SUAS PROFECIAS DO QUE QUALQUER MENSAGEIRA DE OUTRA RELIGIÃO CRISTÃ, ou ISLÂMICA.

Ela também nos avisa em livros para não substituirmos a Bíblia por ela. A Bíblia é e será sempre a primeira inspiração dada por Deus aos homens. Ellen G. White foi somente uma pessoa que Deus usou para ajudar-nos e mostrar-nos o que Satanás fará quando vir que o seu tempo está perto de acabar, e o fim do mundo se aproxima.

Agora vejam que ela estava certa mais uma vez. Como pode isto acontecer vez após vez? A Bíblia nos dá a resposta. Encontramos isto em Amós 3:7: "Certamente o Senhor Deus não fará cousa alguma, sem primeiro revelar o seu segredo aos seus servos, os profetas."

Novamente referindo-se aos acontecimentos de 11 de setembro aqui está o que ela comentou sobre a cidade de Nova York. Até parece que estava lá observando pessoalmente o que ocorria. Vejam o que ela escreveu. E lembrem-se que ela escreveu isto 92 anos atrás, antes de tudo acontecer:

"Em relação à cidade de Nova York, eu sei somente que um dia os enormes edifícios serão lançados por terra. O cenário que passou diante de mim foi um alarme de fogo. Homens olhando para os magníficos e esplendorosos edifícios que supunham serem à prova de fogo. Mas esses edifícios estavam sendo consumidos pelo fogo como se fossem feitos de piche. As máquinas e carros dos bombeiros não podiam fazer nada para deter a destruição. Os bombeiros não podiam usar suas máquinas para deterem a perda. Essas magníficas e fortíssimas estruturas estavam caindo sem haver jeito de salvá-las. Nem podemos imaginar quão assustadores serão as cenas do que vai acontecer.

As predições sobre Nova York estão escritas nos livros Last Days Events, páginas 112, e 113. Também falou sobre isto no livro Life Sketches of Ellen G. White.

Profecias espetaculares não acham? No entanto isto foi escrito em 1906 e 1909. Há muitas pessoas reconhecidas como profetas, mas nenhuma fez uma predição destes eventos na escala e claridade que ela fez. Joseph Smith, Elijah Mohammad Gandhi, Papa John Paul II. Todos estes permaneceram em silêncio sem anunciar ao povo o perigo que estava para acontecer em Nova York. No entanto, há muitos homens e mulheres evangelistas que se consideram profetas, com habilidade de profetizar o futuro, mas, onde estavam eles?

Veja só a opinião de um editor católico da revista Catholic Extension Magazine. Ele diz: "Os adventistas do sétimo dia são o único grupo que tem uma argumentação correta dentre todos os protestantes." Que excepcional endosso para nossa denominação.

Mais uma profecia realizada.

8. Ellen White nos deu mais alertas dos perigos que teremos de encarar nos últimos dias. Agora mesmo temos um problema que ninguém sabe decifrar, mas ela nos alertou sobre isto. Ela disse que nos tempos do fim Satanás envenenaria o ar que nós respiramos e que o veneno do ar mataria homens e animais...

Já ouviu falar do Anthrax? Também no livro O Conflito dos Séculos ela nos alerta que Satanás envenenaria o ar e milhões morreriam. Não faz muito tempo que Saddam Hussein matou milhares de curdos com produtos químicos e biológicos colocados no ar. Foi o que chamam de "Guerra Química e Biológica”. Não vamos também negar que estamos todos alarmados e com medo do germe do ar, Anthrax, e as ameaças de varíola?

Aqui nesta nação estamos procurando uma solução para nos defender dessas ameaças do ar. Estamos vivendo em tempos perigosos. Não cometamos o engano de não acreditar que o Anticristo está fazendo o seu trabalho. Nós temos que estar firmes em nossa fé e obedecer os mandamentos de Deus, ou certamente estaremos perdidos. Estamos vivendo nos tempos dos livros de Daniel e Apocalipse.

Se alguém quiser saber mais sobre Ellen White ou das mensagens da nossa Igreja Adventista do Sétimo Dia, ou se quiser compreender o livro de Apocalipse, será bem-vindo para nos visitar. Nossa igreja se chama Kingdom Growth Mission Adventist Church, e nosso endereço é: 5435 Wookfield, AL USA



Compreendendo Ellen White

Alberto R. Timm
Diretor do Centro de Pesquisas Ellen G. White do Brasil, Centro Universitário Adventista, Engenheiro Coelho, SP.

Os adventistas do sétimo dia escreveram extensivamente sobre Ellen White ao longo de sua história de aproximadamente 150 anos. A grande maioria desses escritos tencionava provar a natureza autêntica do seu dom profético ou defendê-lo de um amplo espectro de críticas, como acusações de erros históricos, plágio, transes psicológicos e distorções teológicas.

As discussões a respeito dessas questões, do lado positivo, ajudaram significativamente nosso povo a compreender a função e os escritos de Ellen White. A fé de muitos membros da Igreja foi fortalecida. Do lado negativo, as discussões levaram muitos eruditos e ministros adventistas a uma abordagem a esses escritos mais focalizada em questões controvertidas.

O propósito do presente artigo é considerar brevemente a necessidade de (1) se reconhecer o perigo de tal abordagem focalizada em questões controvertidas, (2) de se deixar de lado as questões periféricas para enfatizar o âmago da mensagem de Ellen White, (3) de se compreender os grandes temas de sua mensagem, e (4) de se viver em conformidade com essa mensagem.

Abordagem perigosa

Os eruditos e os pastores adventistas precisam estar bem informados a respeito das principais críticas levantadas contra o dom profético de Ellen White, de modo que, sempre que necessário, possam responder às questões de forma adequada. Mas eles deveriam também estar cientes dos riscos envolvidos na tarefa de responder a essas questões.

Um dos riscos é a tentação de se gastar tanto tempo com o lado negativo da específica questão, que a beleza da mensagem relacionada com ela acabe sendo perdida. Isso pode ocorrer pelo fato de que algumas das questões mais complexas e especulativas requerem um processo quase infinito de busca de uma solução para o problema. Existem também mistérios nos escritos divinamente inspirados que nunca serão plenamente compreendidos pela mente humana.1

Outro risco é a forte tendência de uma abordagem aos escritos de Ellen White, focalizada em questões controvertidas, acabar se transformando em uma ênfase apologético-legalística. Como as preocupações apologéticas do período pré-1888 acabaram levando muitos adventistas a uma abordagem legalística, assim as discussões modernas acerca das tecnicalidades dos escritos de Ellen White podem gerar uma investigação desses escritos destituída de vida. Alguns podem até mesmo concluir seus estudos com a impressão distorcida de que o propósito principal desses escritos é criticar e corrigir a vida dos outros.

Uma abordagem aos escritos de Ellen White focalizada em questões controvertidas pode distorcer também a compreensão do leitor a respeito do equilíbrio temático geral desses escritos. Um sério problema é gerado quando questões secundárias e assuntos periféricos substituem o estudo dos temas centrais desses escritos. Isso gera um paradigma distorcido pelo leitor, que ignora em grande parte o propósito da própria escritora.

Da periferia ao centro

Algumas pessoas se interessam muito por detalhes da vida pessoal de Ellen White. Outras se preocupam mais com a mecânica de sua inspiração e com o seu estilo literário. Ainda outras se especializaram em encontrar nos escritos dela respostas a todo tipo de questões. Mas esse conhecimento é útil apenas na proporção em que ajuda a fortalecer a fé pessoal no escopo mais amplo da mensagem. Quão lamentável é o fato de que existem pessoas mais preocupadas com as questões relacionadas com esses escritos do que com a própria mensagem neles proclamada.

Existem também aqueles cujo principal interesse gravita em torno de certos tópicos específicos dos escritos de Ellen White. Assuntos como a escatologia, a reforma de saúde, a perfeição e a natureza de Cristo durante a encarnação têm sido identificados por eles como o âmago de seus escritos. Seus ensinos sobre esses assuntos são deveras esclarecedores, mas qualquer intérprete honesto de Ellen White jamais aceitará o reducionismo do “princípio da ampulheta”, pelo qual a amplitude da sua mensagem é reduzida a um tema apenas. Jamais deveríamos permitir que questões periféricas e doutrinas isoladas nos absorvam de tal forma que percamos de vista os grandes temas de sua mensagem.

Aceitar a orientação profética de Ellen White significa, em realidade, muito mais que vindicá-la das críticas ou expor alguns aspectos de sua mensagem. Significa enaltecer o impulso geral da sua mensagem, permitindo que cada tema desempenhe seu papel específico dentro do amplo escopo temático da mensagem.

O conceito de Vern S. Poythress a respeito de uma “teologia sinfônica” de múltiplas perspectivas2 pode contribuir para uma melhor compreensão da mensagem de Ellen White. Ao invés de termos muitos solos temáticos, seria muito mais elucidativo e enriquecedor se tais solos fossem unidos em uma sinfonia temática que preservasse a beleza da intenção original da autora. Isso pode parecer uma tarefa desafiadora, mas seria a maneira mais apropriada de compreender a mensagem de Ellen White.

Tal estudo abrangente da mensagem de Ellen White não afasta necessariamente da Bíblia qualquer pessoa. Permitir que esses escritos cumpram a sua função básica – de chamar “a atenção à Bíblia”, auxiliar “na compreensão da Bíblia” e ajudar “a aplicar os princípios bíblicos na nossa vida”3 – nos levará, em realidade, a uma melhor apreciação da verdade bíblica.

Temas fundamentais

Embora Ellen White (à semelhança de Martinho Lutero e João Wesley) jamais tenha sistematizado realmente os seus conceitos teológicos, várias de suas declarações fornecem lampejos úteis para tal sistematização.4 Consideraremos brevemente, na apresentação que segue, a sua interpretação de temas fundamentais como Deus, o conflito cósmico, o concerto eterno, o santuário, as três mensagens angélicas e o remanescente.5 Tenho plena convicção de que suas exposições sobre esses temas são muito úteis para a compreensão da mensagem bíblica.

Deus como o centro originador. Ellen White fala a respeito de Deus como “o grande centro” do qual “toda a vida procede” e ao qual “pertencem todo o serviço, homenagem e lealdade” (cf. Atos 17:24-28).6 Sua percepção de Deus como o centro é um conceito dinâmico que se desdobra das três pessoas da Divindade7 para a Sua obra de redenção. Dessa forma, ela qualifica como centro não apenas a Divindade mas também Cristo e Seu sacrifício expiatório.

Falando a respeito da posição de Cristo dentro do amplo espectro da mensagem adventista, a Sra. White afirma que “a verdade para este tempo é ampla em seus contornos, de vasto alcance, abrangendo muitas doutrinas; estas, porém, não são unidades destacadas, de pouca significação; são unidas por áureos fios, formando um todo completo, tendo Cristo como o centro vivo.”8

A respeito da obra expiatória de Cristo, a mesma autora assevera que “Jesus Cristo, e Este crucificado” é o “grande interesse central”.9 A cruz do Calvário é considerada como “o grande centro”10 e a expiação, como “a grande essência, a verdade central”.11 Ela explica que “a cruz deve ocupar um lugar central porque ele é o meio da expiação da raça humana e pela influência que ela exerce em todas as partes do governo divino”.12

O grande conflito cósmico como a moldura. Todo o drama da existência humana é colocado por Ellen White dentro da moldura do grande conflito entre Deus e Satanás, e as disputas corolárias entre o bem e o mal, a verdade e o erro, e aqueles que servem a Deus e aqueles que seguem a Satanás (Apoc. 12).

Orientando o estudante das Escrituras, ela afirma que ele “deve aprender a ver a Palavra como um todo, e bem assim a relação de suas partes. Deve obter conhecimento de seu grandioso tema central, do propósito original de Deus em relação a este mundo, da origem do grande conflito, e da obra da redenção. Deve compreender a natureza dos dois princípios que contendem pela supremacia, e aprender a delinear sua operação através dos relatos da História e da profecia, até à grande consumação. Deve enxergar como este conflito penetra em todos os aspectos da experiência humana; como em cada ato de sua vida ele próprio revela um ou outro daqueles dois princípios antagônicos; e como, quer queira quer não, ele está mesmo agora a decidir de que lado do conflito estará.13

O concerto eterno como a base. Ellen White explica que no contexto deste grande conflito, Deus salva os seres humanos por meio do Seu concerto eterno de graça. Ela declara que “a salvação da raça humana sempre fora objeto de consideração nos concílios do Céu. O concerto de misericórdia fora feito antes da fundação do mundo. Existiu por toda a eternidade, e é chamado de misericórdia. Tão certo como nunca houve um tempo em que Deus não existisse, nunca houve também um momento em que não fosse o deleite da Mente Eterna manifestar Sua graça à humanidade”.14

Considerando os concertos bíblicos como passos progressivos no desenvolvimento do concerto eterno da graça de Deus, Ellen White pode manter um relacionamento tipológico bem equilibrado entre o velho e o novo concertos.15 O concerto do Sinai, por exemplo, foi considerado por ela como tendo o propósito de restaurar os princípios do concerto eterno feito anteriormente com Abraão, permitindo que os israelitas vissem “sua índole pecaminosa e necessidade de perdão” e sentissem “que necessitavam do Salvador revelado no concerto abraâmico e prefigurado nas ofertas sacrificais.16

O concerto eterno da graça de Deus foi descrito pela mesma autora como encontrando a sua expressão típica nos sacrifícios terrenos do Antigo Testamento (cf. Êxo. 25:8) e a sua expressão antitípica no santuário celestial do Novo Testamento (cf. Heb. 8 e 9).17

O santuário como motivo organizador. Analisando-se os escritos de Ellen White, pode-se ver que ela considerava o santuário como algo mais amplo e bem mais abrangente do que uma simples doutrina entre outras. Ela, em realidade, identificou o santuário como o motivo organizador da verdade bíblica, ao declarar que “desde a criação e queda do homem até ao tempo presente, tem havido um contínuo desenrolar do plano de Deus para a redenção, por meio de Cristo à raça caída. O tabernáculo e o templo de Deus na Terra tinham por modelo o original no Céu. Em volta do santuário e seus serviços reuniam-se misticamente as grandes verdades que se deviam desenvolver através de sucessivas gerações”.18

O término das 2.300 tardes e manhãs de Daniel 8:14, em 1844, era reconhecido pela Sra. White como o ponto de partida tanto da purificação do verdadeiro santuário, no Céu, como da final restauração do sistema de verdades bíblicas conectadas com o santuário, na Terra. Ela esclareceu que a compreensão do santuário pelos primeiros adventistas observadores do sábado “revelou um conjunto completo de verdades, ligadas harmoniosamente entre si, mostrando que a mão de Deus dirigira o grande movimento do advento e apontara novos deveres ao trazer a lume a posição e obra de Seu povo”.19

Ela considerava “a compreensão correta do ministério do santuário celestial” como “o alicerce de nossa fé”,20 pelo fato de que “o santuário no Céu é o próprio centro da obra de Cristo em favor dos homens. Diz respeito a toda alma que vive sobre a Terra. Patenteia-nos o plano da redenção, transportando-nos mesmo até ao final do tempo, e revelando o desfecho triunfante da controvérsia entre a justiça e o pecado”.21

Mantendo um íntimo relacionamento entre Cristo e o Seu santuário, a Sra. White pode afirmar corretamente que “Cristo, Seu caráter e obra, é o centro e a circunferência de toda verdade. Ele é a cadeia que liga as jóias de doutrina. NEle se encontra o inteiro sistema da verdade”.22 Portanto, o santuário era identificado por ela como o motivo fundamental que organiza as doutrinas bíblicas ao redor de “Cristo como o centro vivo”.23

As três mensagens angélicas como a proclamação escatológica. Este sistema doutrinário, centralizado em Cristo e organizado pelo santuário, era visto por Ellen White como havendo sido restaurado no contexto escatológico do tempo do fim pela proclamação das três mensagens angélicas de Apocalipse 14:6-12. Ela se referiu metaforicamente a essas mensagens como degraus conduzindo à “sólida plataforma inamovível” da verdade presente.24

Recordando a experiência dos primeiros adventistas observadores do sábado, ela explicou que “muitos viram a perfeita cadeia de verdades nas mensagens [angélicas], e alegremente as receberam em sua ordem, e pela fé seguiram a Jesus no santuário celestial. Estas mensagens foram-me representadas como uma âncora para o povo de Deus. Aqueles que as compreendem e recebem serão preservados de ser varridos pelos muitos enganos de Satanás”.25

Que as três mensagens angélicas compreendem embrionariamente os principais componentes do sistema doutrinário adventista é evidente pelo fato de que a Sra. White referiu-se várias vezes àquele sistema em termos daquelas mensagens26 e, mais especificamente, da terceira mensagem angélica.27

O remanescente como o resultado missiológico. A proclamação, pelas três mensagens angélicas, do sistema integrado da verdade presente era visto por Ellen White como suscitando e preparando um povo remanescente para a segunda vinda de Cristo (cf. Apoc. 12:17; 14:12).28

A Sra. White afirmou que “Deus está guiando um povo do mundo para a exaltada plataforma da verdade eterna – os mandamentos de Deus e a fé de Jesus”.29 “A terceira mensagem angélica deve realizar a sua obra de separar das igrejas um povo que tomará a sua posição sobre a plataforma da verdade eterna.”30

“Almas sinceras verão a cadeia da verdade presente. Elas verão suas harmoniosas conexões, elo após elo unidos em um grande todo, e apegar-se-ão a ela. A verdade presente não é difícil de ser compreendida, e o povo ao qual Deus está conduzindo estará unido sobre esta plataforma ampla e firme.”31

Aqueles que estão sobre essa plataforma são descritos como protegidos por Cristo no contexto do conflito cósmico (cf. Apoc. 12:17). “O inimigo das almas está determinado a se opor a todos aqueles que firmam os seus pés sobre a plataforma da verdade eterna, que levantam o estandarte contendo a inscrição: ‘os mandamentos de Deus e a fé de Jesus’. Eles são o alvo do ódio mortal de Satanás. Mas esteja seguro de que Cristo peleja com o Seu exército. Ele mesmo conduz os Seus seguidores, e renovará a força de cada fiel soldado.”32

E a mesma autora acrescenta que “a menos que estejamos sobre a elevada plataforma da verdade presente, seremos levados pela maré dos erros enganadores que estão assolando o mundo”.33

Com esses conceitos em mente, podemos sugerir que a ampla estrutura teológica provida pelo inter-relacionamento dos temas anteriormente mencionados parece ser um acurado ponto de partida para o estudo da mensagem de Ellen White.

Viver de acordo com a mensagem

Mesmo compreendendo e enfatizando os grandes temas da mensagem de Ellen White, nos deparamos com o risco de perder de vista o seu propósito principal: levar-nos a uma verdadeira experiência salvífica. A teoria doutrinária é muito importante, mas ela não nos significa absolutamente nada, sem a influência santificadora da verdade sobre a nossa vida pessoal como um todo (João 17:17).

A própria Sra. White adverte a respeito desse problema ao afirmar que “muitos adotam uma religião intelectual, uma forma de piedade, sem que seja purificado o coração”.34 “Um homem pode ouvir e reconhecer toda a verdade, e todavia nada conhecer da piedade pessoal e da verdadeira religião experimental. Ele pode explicar o caminho da salvação a outros, e ser todavia um rejeitado.”35

Alguns podem estar satisfeitos com tecnicalidades sem vida e questões periféricas relacionadas com os escritos de Ellen White, ou mesmo com um conhecimento teórico de sua mensagem. Mas nós deveríamos ir além do nível teórico para uma verdadeira experiência salvífica com Cristo e Seus ensinos. De acordo com as palavras da própria Sra. White, “como a flor se volve, para o Sol, para que os seus brilhantes raios a ajudem a desenvolver a beleza e simetria, assim devemos nós volver-nos para o Sol da justiça, a fim de que a luz do Céu incida sobre nós e nosso caráter seja desenvolvido à semelhança de Cristo”.36

A compreensão da mensagem de Ellen White será destituída de proveito para nós se não permitirmos que ela exerça uma influência santificadora em nossa vida. Além do nível teórico, devemos permitir que a sua mensagem nos leve a uma verdadeira experiência santificadora com Cristo e Seus ensinos. Se Cristo for o centro de nossa experiência religiosa, nós nos deleitaremos em conhecer mais e mais a Sua vontade como revelada nos escritos de Ellen White.

Referências

1 Ellen G. White, Obreiros Evangélicos, pág. 312; Caminho a Cristo, págs. 105-113.

2 Vern S. Poythress, Symphonic Theology: The Validty of Multiple perspectives in Theology (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1987).

3 T. Housel Jemison, A Prophet Among You (Mountain View, CA: Pacific Press, 1955), págs. 364-374; Roy E. Graham, Ellen G. White: Co-Founder of the Seventh-day Adventist Church, American University Studies, série 7; Theology and Religion, vol. 12 (Nova Iorque: Peter Lang, 1985), págs. 140-184.

4 Ellen G. White, Primeiros Escritos, págs. 63, 250-261; Evangelismo, págs. 168-278; Counsels to Writers and Editors, págs. 28-32, 52-54.

5 Ver Alberto R. Timm, O Santuário e as Três Mensagens Angélicas: Fatores Integrativos no Desenvolvimento das Doutrinas Adventistas (Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 2000), págs. 239, 252 e 284.

6 Ellen G. White, Testimonies for the Church, vol. 6, págs. 236 e 237; O Maior Discurso de Cristo, pág. 77; Obreiros Evangélicos, pág. 396

7________, Evangelismo, págs. 613-617; Seventh-day Answer Questions on Doctrine (Washington, DC: Review and Herald, 1957), págs. 641-646.

8 ________, Mensagens Escolhidas, vol. 2, pág. 87; ver também vol. 1, págs. 158, 383-388.

9 ________, Testemunhos Para Ministros, pág. 331.

10 ________, in Seventh-day Adventist Bible Commentary, vol. 4, pág. 1173.

11 ________, Evangelismo, pág. 223.

12 ________, Testimonies for the Church, vol. 6, pág. 236.

13 ________, Educação, pág. 190.

14 ________, Meditações Matinais, 1959, pág. 76.

15 ________, Patriarcas e Profetas, págs. 363-373; Review and Herald, 02/03/1886, pág. 129; Youth’s Instructor, 18/07/1901, pág. 226.

16 ________, Patriarcas e Profetas, págs. 371-372.

17 ________, O Desejado de Todas as Nações, págs. 23-26; Cristo em Seu Santuário.

18 ________, Meditações Matinais, 1959, pág. 194.

19 ________, O Grande Conflito, pág. 423.

20 ________, Evangelismo, pág. 221.

21 ________, O Grande Conflito, pág. 488.

22 ________, Meditações Matinais, 1962, pág. 14.

23 ________, Mensagens Escolhidas, vol. 2, pág. 87.

24 ________, Primeiros Escritos, págs. 258 e 259.

25 Ibidem, pág. 256.

26 Ver O Grande Conflito, págs. 311 e 312, 355 e 356, 435-438, 594 e 595, 603-612; Testemunhos Seletos, vol. 2, pág. 156.

27 Ver Eventos Finais, págs. 199-202; Testimonies for the Church, vol. 5, págs. 206 e 207; vol. 6, pág. 241.

28 Ver Mensagens Escolhidas, vol. 2, págs. 384 e 385.

29 ________, Testemunhos Para Ministros, pág. 29.

30 ________, Testemonies for the Church, vol. 6, pág. 61.

31 Ibidem, vol. 1, pág. 326.

32 Ver Signs of the Times, 15/09/1898, pág. 3.

33 Ver Manuscript Releases, vol. 19, pág. 54.

34 Ver Caminho a Cristo, pág. 35.

35 Ver Evangelismo, pág. 682.

36 Ver Caminho a Cristo, pág. 68.

Fonte: http://www.dsa.org.br/ministerio/Compreendendo%20Ellen%20White.htm



Revista Ministério - Edição 6 - Novembro/Dezembro de 1999
Crede em Seus Profetas

Entrevista com Dr. Juan Carlos Viera
por ZINALDO A. SANTOS

Uma das crenças fundamentais da Igreja Adventista do Sétimo Dia afirma: "Um dos dons do Espírito Santo é a profecia. Esse dom é uma característica da Igreja remanescente e foi manifestado no ministério de Ellen G. White. Como a mensageira do Senhor, seus escritos são uma contínua e autorizada fonte de verdade e proporcionam conforto, orientação, instrução e correção à igreja. Eles também tornam claro que a Bíblia é a norma pela qual deve ser provado todo ensino e experiência."

Que a doutrina adventista não se deriva de Ellen White é muito claro; a Bíblia é sua fonte inegável. Mas os críticos, por ignorância ou má fé, não economizam distorções a respeito do seu ministério e da maneira como a Igreja Adventista o vê. Com o objetivo de ajudar a esclarecer dúvidas a respeito da manifestação do dom profético na vida e obra da Sra. White, Ministério entrevistou o Dr. Juan Carlos Viera, diretor do Centro de Pesquisas Ellen White, localizado em Washington, Estados Unidos. Uruguaio de nascimento, o Dr. Viera serviu à Igreja na América do Sul, durante muitos anos, como pastor distrital, evangelista e administrador. Posteriormente, fez doutorado em missiologia, nos Estados Unidos.

A seguir, os principais trechos da entrevista, concedida por ocasião do concílio da Associação Ministerial, em Foz do Iguaçu, PR.

Ministério: Quais os questionamentos atualmente levantados sobre a autoridade bíblica?

Dr. Juan Carlos Viera: Movimentos que surgem nos ambientes evangélicos e católicos tratam de certas formas de hermenêutica, certos métodos, como por exemplo, o método histórico-crítico e outros métodos de investigação e interpretação das Sagradas Escrituras. Esses métodos colocam certas dúvidas sobre a autoridade da Bíblia. Como adventistas do sétimo dia, continuamos crendo que a Bíblia é a autoridade final da nossa doutrina, porque a aceitamos como sendo inspirada por Deus. Embora a mensagem bíblica nos tenha chegado através de mensageiros humanos, cremos que essa mensagem tem suficiente autoridade para que seja aceita. Essa posição é muito clara na Igreja Adventista. É possível que alguns até já estejam começando a questioná-la, individualmente, mas essa é a posição oficial da Igreja em relação à Bíblia.

Ministério: Tais questionamentos afetam, de certa forma, o ensinamento sobre o dom de profecia?

Dr. Viera: Pode afetar. O fato de alguém questionar a Bíblia é o primeiro passo para questionar também outros escritos inspirados. Na verdade, ao questionar a Bíblia, a pessoa já questionou antes os escritos de Ellen White; afinal, é mais fácil questionar um profeta contemporâneo que um da antigüidade.

Ministério: Que críticas são feitas mais freqüentemente, hoje, aos escritos de Ellen White?

Dr. Viera: A principal crítica, feita durante os últimos anos, refere-se ao uso que ela fez de outras fontes. A idéia que um profeta recorra a outros escritos e utilize frases de outros autores, tem sido muito questionada. De modo que a Igreja tem sido obrigada a fazer uma profunda investigação para ver se não ocorreu a mesma coisa com os profetas bíblicos. Felizmente, a conclusão é afirmativa; escritores bíblicos, especialmente no caso de Lucas, o evangelista, e no do apóstolo João, ao escrever o Apocalipse, também usaram outras fontes. Um ex-diretor do White Estate, Pastor Robert Olson, escreveu um livro intitulado 101 Perguntas Sobre o Santuário, no qual ele conclui, com base em profunda investigação, que o apóstolo João utilizou em muitas ocasiões referências ao Livro de Enoch, que circulava profusamente nos dias apostólicos. A frase "vi um novo Céu e uma nova Terra", por exemplo, aparece no tal livro; e o apóstolo a usou textualmente para expressar sua própria visão.

Ministério: Como harmonizar essa prática com o fato de que Deus inspira o profeta?

Dr. Viera: A Bíblia afirma que Deus fala "de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas" (Heb. 1:1). De modo que podemos pensar em mais de um modelo de comunicação da parte de Deus com Seus mensageiros. Um deles é o modelo visionário, ou seja, a comunicação processada através de visões. A Bíblia está cheia de exemplos. Há o modelo testemunhal, exemplificado pelos evangelistas Mateus e João; e o histórico, do qual Lucas também é um notável exemplo. Em todos esses modelos está presente o fator inspiração. Deus inspirou o profeta no processo de relacionamento com a mensagem que tencionava transmitir: através de visões, testemunho pessoal, ou testemunhos históricos, busca de informação em outras fontes.

Ministério: Quão abrangente é a expressão "espírito de profecia"?

Dr. Viera: Esse é um termo que se tornou um tanto familiar aos adventistas do sétimo dia, e que, de alguma maneira, não diz toda a realidade. A maior manifestação do dom de profecia é a Bíblia. Apesar disso, às vezes mencionamos algo como "a Bíblia e o espírito de profecia", como se fossem duas coisas diferentes. A maior manifestação do espírito de profecia é a própria Bíblia, pois a expressão significa basicamente a voz do Espírito através dos profetas. Isso é o que explica João em Apocalipse 19:10, onde o anjo refere-se a outros profetas ("irmãos") que, como João "mantêm o testemunho de Jesus", "o espírito de profecia". Quando nos apropriamos dessa expressão para referir-nos apenas à Sra. White, limitamos a sua aplicação. E isso nem sempre soa bem. Realmente, todos os profetas de Deus estão incluídos na expressão espírito de profecia.

Ministério: O lema de Lutero - Sola Scriptura - é o mesmo da Igreja Adventista do Sétimo Dia?

Dr. Viera: Exatamente. Cremos na Bíblia e a aceitamos como regra de fé e prática religiosa; é a base de tudo porque é a voz de Cristo à Sua Igreja. O que chamamos de "espírito de profecia", a respeito de que melhor seria dizermos o dom profético manifestado na Igreja Adventista, tem como propósito básico levar-nos à Bíblia, ajudar-nos a entendê-la. Seria muito ofensivo para a própria irmã White, saber que em algum momento estamos usando seus escritos como uma segunda Bíblia. Nunca foi seu propósito substituir a Bíblia, ou fazer de seus escritos a base de nossa doutrina. O único propósito dos escritos da Sra. White, e ela o disse muitas vezes, é o de conduzir-nos às Escrituras e ajudar-nos a compreendê-las.

Ministério: A Sra. White é a última palavra em termos de interpretação teológica para os adventistas?

Dr. Viera: Um momento crítico na vida da Igreja foi o ano de 1888, quando foram discutidos dois grandes temas. Um estava relacionado com as profecias de Daniel 7 e 8, e o outro grande tema era a justificação pela fé. Em várias oportunidades foi perguntado à Sra. White qual era a sua interpretação sobre os chifres de certos animais que aparecem na profecia de Daniel 7. Havia uma discussão muito intensa entre dois teólogos adventistas da época, e eles queriam ter o apoio da Sra. White. Sua resposta foi que deveriam ir à Bíblia, em vez de procurar sua opinião. Deveriam estudar profundamente a Bíblia para encontrar nela a base de qualquer conclusão. A Sra. White jamais tencionou ser a última palavra de interpretação profética para a Igreja. Agora, o que ela define são os pilares da nossa fé. Ela diz que esses pilares foram revelados através da inspiração; e que eles não podem ser removidos. Quais são eles? A segunda vinda de Cristo, o sábado, o estado inconsciente dos mortos, a doutrina do santuário celestial.

Ministério: O senhor concorda que alguns problemas relacionados com a compreensão do trabalho da Sra. White, são devidos à compilação e tradução deficientes?

Dr. Viera: Sempre esperamos que as compilações e traduções do material de Ellen White sejam uma ajuda para a igreja. As compilações têm realmente o perigo de que o compilador oriente o livro. Tem-se criticado, por exemplo, o livro Mensagens aos Jovens. A crítica é que ele deve ter sido compilado por um adulto que não compreendia os jovens, e que buscou as declarações mais negativas da Sra. White sobre a recreação e outros aspectos da vida juvenil, resultando num livro muito negativo para a juventude. Esse perigo realmente existe. Mas o objetivo das compilações é ajudar a Igreja, reunindo todas as referências sobre um determinado tema; normalmente elas trabalham com um tema específico, como o lar, a educação dos filhos, etc. Da minha própria experiência como compilador, tenho sentido que é uma solene responsabilidade fazer esse trabalho. Precisamos estar seguros de dar a mensagem correta. Depois que preparamos os manuscritos, eles passam por várias mãos. Temos a comissão de manuscritos, cujos membros devem ler detalhadamente o material, para que haja a segurança de que ele contém a mensagem da Sra. White, e não a do compilador. Apesar de que o texto é o da Sra. White, o compilador pode selecionar de tal maneira que acabe dizendo uma coisa que ela não quis dizer. Somos conscientes do problema e trabalhamos atentamente para evitá-lo.

Ministério: Alguns críticos dizem que a Sra. White fez declarações de cunho racista. O que o senhor diz a respeito disso?

Dr. Viera: Minha resposta é que se houve uma pessoa que não foi racista e que se esforçou por trabalhar em favor dos negros, por todos os meios, foi a irmã White. É certo que, em alguns momentos, ela deu alguns conselhos que eram oportunos para sua época. Por exemplo, ela mencionou que os obreiros de cor, negros, deveriam pregar naquelas áreas especialmente habitadas por negros. Alguns têm entendido isso como racismo; mas, para a época em que ela viveu, era o melhor conselho. Também existe a sugestão relacionada à escolha de um cônjuge, o que é muito importante. Em seu tempo, um casal misto enfrentaria muitos problemas que afetariam diretamente os filhos; e qualquer pessoa que se aventurasse nesse tipo de união conjugal sabia disso. Agora, aqui no Brasil ou em meu país, o Uruguai, não temos nenhum problema. Mas precisamos lembrar que quando a irmã White deu tais conselhos, o racismo era muito forte em seu país. Tão forte que acarretava grandes tragédias. Era uma situação contextualizada.

Ministério: A Sra. White enfrentou momentos difíceis em sua vida conjugal?

Dr. Viera: O profeta é um ser humano, através de quem Deus apresenta Seu ideal para todos - pessoas e instituições. Mas entre o ideal e o real há uma grande diferença. Às vezes pensamos que Deus transforma o profeta num ser perfeito para o serviço. Davi não era perfeito, cometeu pecados graves, e apesar disso Deus o usou. Nem sempre o profeta pode cumprir o ideal que lhe foi comunicado. A mesma coisa aconteceu com a irmã White. Deus lhe comunicou o ideal para esposos e pais. Entretanto, ela e seu esposo tiveram problemas com os filhos, ou seja, se os deixavam ou não, para ir pregar. Nos primeiros anos, o primogênito ficou sob os cuidados da família Hastings. Bem, ela precisava decidir se cumpriria a tarefa recebida de Deus ou se ficava em casa com seu filho. O filho Edson era um tanto rebelde, até que na juventude converteu-se e se tornou um pastor. Mesmo entre o casal houve problemas. Ambos tinham personalidades fortes e, em determinado momento, houve atritos. Essas coisas nos ajudam a entender que o profeta é um ser humano, com debilidades. Os profetas bíblicos também eram assim. Nenhum deles foi perfeito, mas Deus os usou poderosamente.

Ministério: Segundo o Manual da Igreja, não podemos fazer da aceitação do dom de profecia uma prova de discipulado. O que realmente isso quer dizer?

Dr. Viera: Efetivamente, a própria Sra. White favorece essa idéia. O conselho que a Igreja dá é que uma pessoa, antes de ser batizada, tenha aceito o dom de profecia na vida da irmã White como uma manifestação genuína dos dons espirituais. Porém, uma vez que a pessoa já seja membro da Igreja, o conselho é que não deve ser eliminada, se não crer nessa manifestação. Por que? Bem, há outras questões que também estão no mesmo contexto. Por exemplo, se uma pessoa não devolve o dízimo, não a eliminamos, embora saibamos que ela não está totalmente convertida, nem convencida da autenticidade da Igreja Adventista; por isso não quer apoiá-la financeiramente. O mesmo acontece com o assunto do dom de profecia. Se a pessoa não está totalmente convencida, devemos ajudá-la a compreender melhor o assunto, para que o aceite plenamente. Agora, quanto a ocupar cargos ou funções de responsabilidade, o conselho é bem específico: se uma pessoa não aceita qualquer uma das 27 doutrinas da Igreja, não deve ser eleita para cargo algum.

Ministério: Como a Igreja Adventista se posiciona no contexto do cristianismo?

Dr. Viera: Nós cremos ser a igreja remanescente da profecia bíblica. O que isso significa? Somos o povo a quem Deus está utilizando para exaltar a fé de Jesus, os mandamentos de Deus e o testemunho de Jesus. Essas são as características da Igreja remanescente. Isso não quer dizer que seja uma Igreja perfeita. Às vezes poderíamos transmitir a interpretação do remanescente de Apocalipse 12 e 14, mas também devemos nos lembrar que a Igreja remanescente vive no período de Laodicéia, em Apocalipse 3. Assim o remanescente não é um povo perfeito, e jamais deveria colocar-se na posição de criticar outras denominações. O fato de que Deus o chamou para uma missão especial não significa que é perfeito. A doutrina da Igreja é perfeita, é a Igreja de Deus, mas nós, os indivíduos que a compomos, somos imperfeitos. Às vezes acusamos outras igrejas de serem Babilônia, ou suas filhas, quando realmente a própria Sra. White menciona que isso de fato ocorrerá somente quando elas rechaçarem a última mensagem. Neste momento, nenhuma Igreja é filha de Babilônia, até que rejeitem a advertência final. Nossa posição agora deve ser de respeito às demais denominações, porque nelas há pessoas sinceras, que finalmente aceitarão a mensagem, unindo-se a nós. Devemos ser cuidadosos para não nos adiantarmos aos fatos. Podemos estar criticando hoje alguém que será nosso futuro irmão. Somente no momento decisivo indicado pela profecia, as igrejas que rejeitarem a advertência divina formarão Babilônia.

Ministério: Que avaliação o senhor faz do atual momento do mundo, à luz da moldura escatológica apresentada pela Sra. White?

Dr. Viera: Primeiramente, é bom lembrar que a escatologia da irmã White está perfeitamente alinhada com a escatologia bíblica. Basicamente o que ela faz é comentar as profecias de Daniel e Apocalipse. Mas eu estou convencido de que estamos muito próximos da segunda vinda de Jesus. Portanto, todas as condições e situações, sejam elas econômicas, políticas ou religiosas, vão se afunilando para esse acontecimento. Eu creio que a globalização, a turbulência econômica, a comunicação em todos os seus ramos (satélite, internet, etc.) indicam duas coisas: primeira, a possibilidade que a Igreja tem de concluir sua missão em curto prazo. Segunda, a oportunidade de o mundo preparar-se, também em curto prazo, para o conflito final. A globalização tem uma face positiva, que é a criação de oportunidades para a igreja fazer seu trabalho rapidamente, e outra negativa, que é o uso que o mundo também fará para municiar-se tendo em vista última batalha. O que desejo alertar é para que, em meio às mudanças que ocorrem no mundo, não nos adiantemos aos fatos. Parece que alguns irmãos são caçadores de decretos, e vivem procurando mostrar que a lei dominical já está em marcha. Devemos ser cuidadosos. Quando essa lei for ditada, será uma lei especial que incluirá a pena de morte. A Sra. White não está se referindo a legislações restritas a certas regiões, que proíbem a comercialização no domingo. Lamentavelmente, temos alguns pregadores que estão enfatizando muito essa questão como se fosse já o cumprimento da profecia. Creio, sim, que todo o cenário está sendo montado para os eventos finais, mas não devemos nos adiantar.

Ministério: A encíclica papal Dies Domini foi muito comentada entre nós. Como o senhor a analisa?

Dr. Viera: Interpreto-a no contexto do mundo preparando-se para o conflito final. Já mencionei que todos os aspectos econômicos, políticos e religiosos focalizam nessa direção. E sabemos que no aspecto religioso haverá certas organizações que tomarão a liderança mundial. Não é de estranhar que essas organizações estejam dando seus passos, ditando pautas, em direção aos seus objetivos finais. Devemos encarar as encíclicas papais como documentos de uma organização religiosa que promovem suas doutrinas, não as nossas. O papa é o sumo pontífice católico e promoverá suas doutrinas católicas. Não há nada de estranho que ele exalte o domingo como dia de culto, e até tente lhe dar uma base bíblica. Mas esse é apenas um evento, dentre muitos outros, que contribuem para o desfecho esperado.

Ministério: A Sra. White, com freqüência, associa a volta de Cristo ao término da pregação do evangelho. Está Deus dependente de nós, neste sentido, ou cumprirá Seus desígnios apesar de nós?

Dr. Viera: A irmã White claramente expressa que a Igreja é o meio que Deus escolheu para dar a mensagem ao mundo. Também diz que o não desempenho dessa tarefa, pela igreja, tem retardado a volta de Jesus. E diz mais: que a terminação da obra acontecerá com uma grande demonstração do poder do Espírito. Assim, as palavras de Cristo aos discípulos, de que eles seriam testemunhas, mas deveriam esperar a dotação do Espírito Santo (Atos 1:8), também se cumprirão na Igreja Adventista. Se olharmos do ponto de vista humano, falta muito para a terminação da obra. Aproximadamente a metade da população mundial não conhece o nome de Cristo. Árabes e muçulmanos não-árabes ocupam cerca de um quarto da população do mundo. Outra quarta parte professa religiões orientais. Humanamente falando é desanimador, inclusive porque há muitas restrições à pregação cristã. Mas a tecnologia pode facilitar o trabalho. E para o Espírito Santo não existem limites. Ele usará instrumentos humildes, trabalhará através deles de uma maneira que vai surpreender, segundo Ellen White. Não sabemos quais surpresas acontecerão, mas a manifestação do Espírito será verdadeiramente gloriosa. Como pastores, nosso papel é preparar a igreja para esse momento, e animá-la a manter seu relacionamento com Cristo, de tal modo que esteja preparada para a Sua volta qualquer que seja a época em que ela ocorrerá. Se daqui a três, cinco, dez ou mais anos, tanto faz. Há três eventos relacionados conosco, cuja data não conhecemos: nossa morte, a terminação do juízo e a volta de Cristo. Mas devemos estar preparados, todos os dias, para esses acontecimentos.

Fonte: http://www.dsa.org.br/ministerio/Crede%20em%20seus%20profetas.htm



Revista Ministério, 1999 Edição 2 - Março/Abril
O Adventismo e a Inspiração

ALBERTO R. TIMM
Ph.D., diretor do Centro de Pesquisas Ellen G. White, do Brasil, e professor de Teologia Histórica no Seminário Adventista Latino-americano de Teologia, Engenheiro Coelho, SP

Provavelmente nenhum componente da fé cristã tem sido tão debatido nos dois últimos séculos como a natureza e a autoridade das Escrituras. Havendo perdido sua confiança na Bíblia, muitos cristãos modernos e pós-modernos não mais a consideram como a "única regra de fé e prática". Sua confiança básica está fundamentada em algum elemento humano específico, ao qual as Escrituras são acomodadas. Enquanto os assim chamados conservadores da extrema-direita tentam manter a Bíblia presa a suas tradições humanas (tradicionalistas), os liberais da extrema-esquerda procuram reler as Escrituras da perspectiva da razão humana (racionalistas), ou da experiência pessoal (existencialistas), ou da cultura moderna (culturalistas). Esses elementos são considerados não apenas como mais autoritativos do que os escritos inspirados, mas até mesmo como o padrão adequado a ser usado para "corrigir" o conteúdo da Bíblia.

Deus suscitou a Igreja Adventista do Sétimo Dia, em meio aos desafios "desses últimos dias" (II Tim. 3:1), para restaurar e enaltecer a autoridade de Sua Palavra.1 Lamentavelmente, porém, o cumprimento dessa missão tem sido seriamente debilitado, em alguns círculos, pela aceitação das mencionadas acomodações da Escritura. Isso significa que a identidade de nossa denominação está sendo desafiada hoje não apenas por forças externas, mas também por algumas vozes internas empenhadas em promover tais acomodações.

Embora os adventistas do sétimo dia tenham escrito extensivamente, durante os últimos 150 anos, sobre o assunto da inspiração, nossa tarefa ainda não está concluída. Como formadores do pensamento da Igreja, devemos não apenas afirmar claramente nossa confiança na Bíblia como a palavra de Deus, mas também responder efetivamente aos novos desafios que tentam solapar a fé dos membros de nossas igrejas. Ao tratar das muitas questões relacionadas com este assunto, jamais deveríamos nos esquecer 1) da natureza sinfônica da inspiração, 2) do escopo todo abrangente da inspiração, e 3) de uma abordagem respeitosa para com os escritos inspirados. Esses três componentes, creio eu, deveriam funcionar realmente como diretrizes básicas em todos os nossos estudos relacionados com a natureza e a autoridade das Escrituras.

NATUREZA SINFÔNICA

Muitas controvérsias adventistas sobre inspiração se devem à tendência tradicional de considerar os escritos inspirados como o produto de uma teoria específica "monofônica" de inspiração. Essa atitude gerou uma clássica polarização sob os rótulos de inspiração verbal, de um lado, e de inspiração de pensamento, do outro.

Para superar as limitações dessa abordagem, vários autores adventistas têm proposto algumas compreensões mais "sinfônicas" e multiformes de inspiração.2 Uma das primeiras foi a controvertida teoria dos "graus" de inspiração, promovida nos anos 1880 por Uriah Smith e George I. Butler. Assumindo que a inspiração divina varia de acordo com as fontes originais de informação a serem transmitidas, Smith argumentou em 1883, em uma carta (22/03/1883) a D. M. Canright, que os escritos de Ellen White eram compostos pelas "visões" genuinamente inspiradas e pelos "testemunhos" não inspirados. No ano seguinte, Butler sugeriu, em uma série de dez artigos na Review and Herald, a partir de 08/01/1884, que todo o conteúdo da Bíblia podia ser classificado sob cinco diferentes "graus" de inspiração e de autoridade, que oscilam dos escritos considerados por ele como inspirados no mais alto grau aos que ele "dificilmente poderia chamar de inspirados". Essas noções, apesar de aceitas por muitos membros, foram severamente criticadas por Ellen White3 e por uma Lição da Escola Sabatina dos Adultos,4 pelo fato de sugerirem um cânon artificial dentro das Escrituras.

Digno de nota foi também a tentativa de Uriah Smith, na Review, de harmonizar as teorias de inspiração verbal e de pensamento, propondo que, se as palavras da Escritura "foram ditas diretamente pelo Senhor", então "as palavras são inspiradas". Se as palavras não vieram diretamente do Senhor, então "as palavras podem não ser inspiradas", mas apenas "as idéias, os fatos e a verdade transmitidos por essas palavras".5 Não consegui encontrar qualquer reação específica a essa proposta.

Novas tentativas significativas de distanciamento de uma compreensão "monofônica" de inspiração foram feitas somente nos anos 1980 e 1990, quando George Rice, Alden Thompson e Juan Carlos Viera expuseram seus diferentes modelos de inspiração. Detendo-se mais com a questão da obtenção das informações proféticas do que com seu efetivo processo de transmissão, Rice, então professor de Novo Testamento na Universidade Andrews, sugeriu a existência dos dois seguintes modelos de inspiração: 1) o modelo profético de revelação divina (visões e sonhos), que explica os escritos proféticos, e 2) o modelo de pesquisa humana exemplificado por Lucas (leitura e entrevistas orais), responsável pelas seções não proféticas.6

Uma compreensão bem mais heterodoxa de inspiração foi proposta em 1991 por Alden Thompson, professor de Teologia Bíblica no Walla Walla College.7 Abandonando as tradicionais teorias adventistas de inspiração verbal e de pensamento, Thompson propôs um "modelo encarnacional" que pudesse reconciliar um espectro mais amplo de dificuldades humanas e de acomodações culturais. Frank Holbrook e Leo Van Dolson viram no estudo de Thompson "os frutos do método histórico-crítico", considerado pelo Concílio Anual da Associação Geral, de 1986, como inaceitável aos adventistas.8

O conceito de modelos de inspiração foi desenvolvido ainda mais em 1996 por Juan Carlos Viera, diretor do Ellen G. White Estate, num artigo publicado pela Adventist Review.9 Enquanto Rice havia falado apenas de dois modelos, Viera sugeriu seis: 1) o modelo visionário, no qual Deus fala "por meio de visões e sonhos proféticos"; 2) o modelo testemunhal, no qual Deus inspira "o profeta a dar seu próprio relato das coisas vistas e ouvidas"; 3) o modelo historiográfico, no qual a mensagem "não vem por meio de sonhos e visões, mas através da pesquisa"; 4) o modelo de aconselhamento, no qual "o profeta atua como um conselheiro para o povo de Deus"; 5) o modelo epistolar, no qual "o profeta escreve saudações, nomes, circunstâncias ou mesmo coisas comuns que não requerem uma revelação especial"; e o modelo literário, no qual "o Espírito Santo inspira o profeta a expressar seus sentimentos e emoções íntimos por meio de poesia e prosa, como nos salmos".

Esses modelos de inspiração refletem a crescente tendência de definir inspiração como um processo multiforme, envolvendo a assistência divina não apenas na transmissão das verdades proféticas, mas também na obtenção das informações. Da perspectiva da obtenção de informações acuradas, pode-se falar genuinamente da existência de modelos de revelação-inspiração. Mas no âmbito da transmissão fidedigna de informações, a discussão se restringe à interação divino-humana na própria redação das Escrituras. Essa interação é explicada na seguinte declaração de Ellen White: "Se bem que eu dependa tanto do Espírito Santo para escrever minhas visões como para recebê-las, todavia as palavras que emprego ao descrever o que vi são minhas, a menos que sejam as que me foram ditas por um anjo, as quais eu sempre ponho entre aspas."10

Disso podemos inferir que, embora Deus tenha falado através dos profetas "muitas vezes e de muitas maneiras" (Heb. 1:1), todo o processo de obtenção de informações e de sua transmissão ao povo foi controlado pelo Espírito Santo. Além disso, enquanto a redação de algumas partes dos escritos inspirados foi divinamente provida, as palavras de outras partes foram escolhidas pelo próprio profeta sob a orientação do Espírito Santo. Mas isso jamais deveria ser usado como um endosso à teoria dos graus de inspiração, ou como um pretexto para desprezar certas partes das Escrituras como menos importantes do que outras (ver Mat. 4:4; II Tim. 3:16 e 17). De acordo com Carlyle B. Haynes, as Escrituras são muito "mais do que um relato não inspirado de idéias inspiradas".11

ESCOPO TODO ABRANGENTE

Um segundo tema que tem suscitado algumas discussões significativas é a extensão temática da confiabilidade dos escritos inspirados. Embora os adventistas tradicionalmente enfatizem a confiabilidade de todas as diferentes áreas do conhecimento abordados nesses escritos, várias tentativas têm sido feitas para limitar essa confiabilidade a questões de salvação.

Já em 1884, George I. Butler sugeriu a existência de diferentes níveis de confiabilidade dentro da Escritura, que ele considerava como diretamente dependentes de seus vários graus de inspiração. Para ele, as Escrituras "são autoritativas na proporção dos graus de inspiração", e são perfeitas apenas na medida em que são necessárias para alcançar o propósito para o qual foram dadas - tornar-nos sábios "para a salvação" (II Tim. 3:15).12

Porém a mais influente declaração rumo a um conceito de confiabilidade limitado à salvação tem sido a afirmação de W. C. White, em 1991, de que sua mãe (Ellen White) "nunca pretendeu ser autoridade em História". Embora no ano seguinte ele explicasse mais claramente: "mamãe nunca desejou que nossos irmãos os [seus escritos] considerassem como uma autoridade no tocante a pormenores da História ou de datas históricas".13 O conceito de que os escritos inspirados não podem ser considerados como autoritativos em questões que não sejam salvação tem sido ecoado por vários outros autores adventistas.

Por exemplo, no Concílio de Professores de Bíblia e de História, em Washington DC, em 1919, o presidente da Associação Geral, Arthur G. Daniells, afirmou que Ellen White "nunca pretendeu ser autoridade em História" ou "professora dogmática de teologia", e que ela nunca considerou suas "citações históricas" como infalíveis.14 A despeito das fortes reações a essas palavras naquela ocasião, e de essa idéia não ser apresentada na literatura adventista pelo menos durante as três décadas seguintes, a controvérsia sobre o assunto ainda não cessou. As divergências sobre a extensão da confiabilidade dos escritos inspirados realmente aumentaram desde o início de 1970.

Crucial em toda essa discussão é o inter-relacionamento entre o conteúdo dos escritos inspirados e o seu propósito último. Não resta qualquer dúvida de que o propósito principal da Escritura é a salvação dos seres humanos (João 5:39). Mas a verdadeira questão é: Podemos isolar algumas partes cronológicas, históricas e científicas da Escritura de seu total propósito salvífico? Deveríamos desenvolver, realmente, um cânon soteriológico de inspiração dentro do cânon geral da Bíblia, semelhante ao princípio hermenêutico cristológico de Martinho Lutero? Não quebraria essa abordagem a unidade da Palavra de Deus? Se levarmos em consideração o que a Bíblia diz a seu próprio respeito, descobriremos que as Escrituras possuem uma natureza todo abrangente, formando uma unidade indivisível (Mat. 4:4; Apoc. 22:18 e 19), e apontando para o mesmo alvo soteriológico (João 20:31; I Cor. 10:11). Além disso, a salvação é descrita nas Escrituras como uma ampla realidade histórica, relacionada a todos os demais temas bíblicos. E é precisamente esse inter-relacionamento temático geral que torna quase impossível para alguém falar das Escrituras hebraico-cristãs em termos dicotômicos ocidentais, como confiáveis em alguns assuntos e não em outros.

Uma vez que o propósito primário da Bíblia é desenvolver fé para a salvação (João 20:31), suas seções históricas, biográficas e científicas provêm, muitas vezes, apenas as informações específicas, necessárias para atingir esse propósito (João 20:30; 21:25). Apesar de sua seletividade em algumas áreas do conhecimento humano, isso não significa que as Escrituras não sejam confiáveis nessas áreas. Pelo contrário, é apenas na inspirada Palavra de Deus que encontramos, de acordo com Ellen White, "um relato autêntico da origem das nações", e "a história de nossa raça, não maculada do orgulho e preconceito humanos". A mesma autora considerava a Bíblia também como a "norma infalível" pela qual as "idéias científicas do homem" deveriam ser provadas.15

Assim a teoria de que os escritos inspirados são confiáveis apenas em questões de salvação reflete mais o pensamento dicotômico ocidental do que a perspectiva todo abrangente da Bíblia e de Ellen White. Reconhecendo que "toda a Escritura é inspirada por Deus" (II Tim. 3:16), nossa compreensão de inspiração deveria sempre preservar esse escopo todo abarcante.

ABORDAGEM RESPEITOSA

Intimamente relacionada com as discussões sobre as teorias de inspiração e a extensão temática de confiabilidade encontra-se a questão extremamente controvertida da existência ou não de erros factuais nos escritos inspirados. Mesmo reconhecendo a confiabilidade de toda a extensão temática desses escritos, permanece ainda a indagação sobre o grau dessa confiabilidade. Em outras palavras, o Espírito Santo permitiu que erros factuais se infiltrassem nos escritos inspirados ou não? Em caso afirmativo, até que ponto?

Os adventistas do sétimo dia têm sido, historicamente, relutantes em falar a respeito da existência de erros factuais nos escritos inspirados. Quando a Associação Geral nomeou uma comissão, em 1883, para fazer uma revisão gramatical de Testimonies for the Church, de Ellen White, o voto não mencionava qualquer erro factual no conteúdo da obra. Apenas "imperfeições" gramaticais deveriam ser corrigidas, sem alterar, "de qualquer forma", as idéias. Mais tarde, porém, no contexto da edição revisada de 1911 de O Grande Conflito, a existência de tais erros de menor importância começou a ser discutida. Assim, no Concílio de Professores de Bíblia e de História, em 1919, A. G. Daniells expressou publicamente o seu ponto de vista de que tanto a Bíblia como os escritos de Ellen White continham várias discrepâncias factuais.16

Durante as três décadas seguintes (1920-1950), os autores adventistas continuaram negando a existência de erros factuais nos escritos inspirados. Embora algumas discussões explícitas desse assunto já tivessem ocorrido na década de 60, foi somente por volta de 1970 que isso se tornou uma verdadeira questão divisiva. Como resultado, existem hoje 1) aqueles que crêem que o Espírito Santo não permitiu que qualquer erro factual se infiltrasse nos autógrafos dos escritos inspirados; 2) aqueles que argumentam que a influência controladora do Espírito Santo permitiu que apenas pequenas discrepâncias insignificantes penetrassem nesses escritos; e 3) aqueles que falam livremente da existência de erros factuais nos escritos inspirados, sem jamais mencionar qualquer influência controladora do Espírito Santo.

Sem uma teoria de intervenção do Espírito Santo, esse último ponto de vista deixa de compreender o que os profetas, que experimentaram pessoalmente essa intervenção, têm a dizer sobre o assunto. Por exemplo, a história do conselho de Natã ao Rei Davi sobre a construção do tempo não menciona apenas que Natã deu um conselho equivocado ao rei, mas também que o Senhor corrigiu o erro (II Sam. 7:1-16). Ellen White também reconheceu a influência controladora do Espírito Santo, ao declarar que Ele "guiou a mente" dos profetas "na escolha do que dizer e do que escrever".

Falando de sua própria experiência, ela acrescentou que "em dar a mensagem, com a pena e falando perante grandes congregações" não era ela quem controlava suas palavras e ações, e sim o Espírito de Deus. Sendo esse o caso, não podemos considerar qualquer teoria de "não intervenção" como uma hipótese válida a ser considerada nas discussões adventistas de inspiração.

Mas mesmo aceitando a intervenção controladora geral de Deus na transmissão da verdade pelo profeta, somos deixados a indagar até que ponto essa intervenção previne os erros. Enquanto alguns autores crêem que os pretensos erros factuais são meros problemas dos copistas ou dificuldades de compreensão, outros autores pensam que não existe outro meio de resolver algumas dificuldades do que admitir que elas são realmente equívocos. Por exemplo, Arthur L. White, secretário do White Estate, declarou em uma palestra, em 1966: "A mensagem inspirada do profeta podia incorporar uma imprecisão em um pequeno detalhe não conseqüente ao conceito básico, ou em um pequeno ponto no campo do conhecimento comum, a 'precisão ou imprecisão do qual a investigação humana é suficiente para informar aos homens'."17

Em 1981-1982, Roger W. Coon, secretário associado do White Estate, propôs uma teoria de "intervenção", que provia espaço para "erros inconseqüentes de pequenos detalhes insignificantes" nos escritos inspirados. Ele explicou que "se, como ser humano, o profeta de Deus erra, e a natureza desse erro é suficientemente séria para afetar consideravelmente a direção da igreja de Deus, o destino eterno de uma pessoa, ou a pureza de uma doutrina, então, e somente então, o Espírito Santo leva imediatamente o profeta a corrigir o erro, de modo a que não ocorra nenhum dano permanente".18

Mais recentemente (1996), Juan Carlos Viera, diretor do White Estate, acrescentou que "o profeta pode cometer erros ortográficos ou gramaticais, bem como outros tipos de imperfeições da linguagem, como um lapsus linguae (lapso da língua) ou um lapsus memoriae (lapso da memória)", mas o Espírito Santo "está em controle da mensagem inspirada", e "sempre corrigiu os Seus mensageiros em questões importantes para a Igreja".19

No entanto, a discussão entre a noção da existência de erros factuais e a idéia da existência de apenas alguns poucos erros insignificantes está longe de ser resolvida e, creio eu, nunca será completamente solucionada. Esse problema deve-se em grande parte, ao fato de que nós, como ocidentais, nos sentimos muito desconfortáveis se não podemos entender e explicar todas as coisas, inclusive a natureza misteriosa das Escrituras. Mas devemos nos conscientizar de que não podemos resolver todas as dificuldades com as quais nos deparamos em nossos estudos da Palavra de Deus.

De acordo com Ellen White, "homens de capacidade têm dedicado uma existência de estudo e oração à investigação das Escrituras, e todavia há muitas porções da Bíblia que não têm sido plenamente exploradas. Algumas passagens da Escritura nunca serão perfeitamente compreendidas, até que, na vida futura, Cristo as explique. Há mistérios a serem esclarecidos, declarações que a mente humana não pode harmonizar. E o inimigo buscará levantar argumentos sobre esses pontos, que seria melhor não serem discutidos".20

Além disso, se aceitamos o princípio de sola Scriptura, deveríamos considerar mais seriamente a maneira respeitosa como os genuínos profetas tratam os escritos dos demais profetas. É interessante notarmos que nenhum profeta do Novo Testamento jamais chamou a atenção para qualquer erro factual do Antigo Testamento; nem o fez Ellen White em relação com a totalidade do cânon bíblico. Se a identificação de tais erros é essencial para fortalecer nossa confiança nos escritos inspirados, como sugerido por alguns teólogos modernos, por que então, nem Cristo, Paulo ou João, ou mesmo Ellen White, nos ajudam nessa tarefa? Se os próprios profetas não se preocupavam com isso, por que deveríamos nós?

Mas esse exemplo de respeitabilidade para com a totalidade dos escritos proféticos nunca deveria ser usado para defender qualquer teoria de inerrância calvinista. Nem deveríamos jamais tornar nossa própria fé e a fé de outros dependente de tais questões insignificantes. Sem fechar nossos olhos para as dificuldades reais encontradas nos escritos proféticos, deveríamos desenvolver uma abordagem mais respeitosa para com esses escritos, que nos permita enfatizar mais o conteúdo das mensagens do que seus continentes humanos, e mais o âmago dessas mensagens do que suas questões periféricas, de tal maneira que "os elementos fundamentais permaneçam como fundamentais, e que os periféricos permaneçam como periféricos".21

ALÉM DE TEORIAS HUMANAS

Nossas considerações anteriores salientaram a importância de se levar em consideração a natureza sinfônica da inspiração, o escopo todo abrangente da inspiração e uma abordagem respeitosa para com os escritos inspirados. Em vez de confinar todos os escritos inspirados dentro de uma teoria específica "monofônica" de inspiração, deveríamos desenvolver uma compreensão mais "sinfônica" e multiforme (Heb. 1:1). Tal compreensão deveria prover espaço suficiente para os vários modelos pelos quais as informações foram obtidas pelos profetas, bem como para a interação divino-humana na transmissão dessas informações através da própria linguagem dos escritos inspirados.

Rejeitando toda teoria dicotômica dos níveis temáticos de inspiração, deveríamos enfatizar a natureza ampla e todo abarcante da Escritura, sem perder de vista a multiforme e indivisível unidade temática do seu conteúdo e a natureza soteriológica do seu propósito último. Evitando tanto o conceito calvinista de inerrância bíblica como a teoria liberal de não intervenção corretiva do Espírito Santo, deveríamos seguir mais de perto o exemplo profético de respeitabilidade para com a totalidade dos escritos proféticos. Nossa fé jamais deveria depender das dificuldades factuais encontradas nas Escrituras.

Teorias humanas, mesmo de inspiração, podem florescer por um pouco de tempo, e então murchar como uma flor numa terra que se tornou árida pelo vento. Portanto, nossa compreensão de inspiração jamais deveria estar subordinadamente exposta aos ventos áridos das doutrinas humanas (Efés. 4:14), mas deve estar fundamentada na inamovível Palavra de Deus, sendo por ela protegida. De acordo com o profeta Isaías, "seca-se a erva, cai a sua flor, mas a palavra de nosso Deus permanece eternamente" (Isa. 40:8).

Referências:

1 Ellen G. White, O Grande Conflito, 36ª ed., Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1988, págs. 593-602.

2 Vern S. Poythress, Symphonic Theology: The Validity of Multiple Perspectives in Theology, Grand Rapids, MI: Zondervan, 1987.

3 Ellen G. White, Carta para R. A. Underwood, 18/01/1889.

4 Sabbath School Lessons for senior Classes, nº 98, I Trim. 1893, pág. 9.

5 Uriah Smith, "Which are revelealed, words or ideas?" Adventist Review and Sabbath Herald, 13/03/1888, págs. 168 e 169.

6 George E. Rice, Luke, a Plagisrist? Mountain View, CA: Pacific Press, 1983.

7 Alden Thompson, Inspiration: Hard Questions, Honest Answers, Hagerstown, MD: Review and Herald, 1991.

8 Holbrook e Dolson, "Preface" em idem, eds., Issues in Revelation and Inspiration, pág. 7.

9 Juan Carlos Viera, "The Dynamics of Inspiration", Adventist Review, 30/05/96, págs. 22-28.

10 Ellen White, "Questions and Answers", Adventist Review and Sabbat Herald, 08/10/1867.

11 Carlyle B. Haynes, God's Book, Nashville, TN: Southern Publishing Association, 1935, pág. 138.

12 G. I. Butler, "Inspirations", Adventist Review, and Sabbath Herald, 08/01/1884 e 27/05/1884

13 W. C. White, "Great Controversy" (nova edição), declaração feita pelo Pastor White, antes do Concílio Mundial da AG, em 30/10/1911.

14 A. G. Daniells, em "Use of the Spirit of Prophecy in Our Teatching of Bible and History", págs. 16 e 26.

15 Ellen G. White, Educação, 7ª ed., Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1997, pág. 173.

16 "General Conference Proceedings", Adventist Review, and Sabbath Herald, 27/11/1883.

17 Arthur White, Ellen White, Washington, DC: Review and Herald, 1982, vol. 6, págs. 302-337.

18 Roger Coon, "Inspiration/revelation: what it is and how it works - II", Journal of Adventist Education 44, Dez. 81/Jan. 82, págs. 18 e 19.

19 Juan Carlos Viera, Op. Cit.

20 Ellen White, Obreiros Evangélicos, 5ª ed., Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1993, pág. 312.

21 Joseph Karanja, "Inerrancy and Sovereignity: A Case Study on Carl F. H. Henry", dissertação de Mestrado em Teologia, Universidade Andrews, 1990.

Fonte: http://www.dsa.org.br/ministerio/O%20adventismo%20e%20a%20inspiraçao.htm

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